Eu me identifico nos teus olhos, na tua busca incessante por algum ponto fixo que te traga um pouco de paz e esperança. Eu me identifico no teu andar que, embora pareça leve e despreocupado, deixa descoberto, somente àqueles que conseguem ler nas entrelinhas, o quão solitário é o teu caminhar.
Eu entendo a tua busca e sei que, na verdade, ela nunca foi por perfeição ou por um ideal romântico exageradamente montado ao longo dos anos em que essa busca existiu. E sim, sei que ela existiu, por mais que negasses, utilizando para isso as mais diferentes distrações e interrupções naquilo que talvez tivesse sido o ciclo natural da vida.
Eu sei que o teu sorriso é sincero quando observas a felicidade e a segurança daqueles casais de mãos dadas naquele belíssimo gramado verde, entretanto também compreendo a dor que sentes, pois eu compartilhei desse mesmo misto de empatia pela alegria do próximo e da dor de não ser eu também andando de mãos dadas.
Quando o teu dia termina e encaras as luzes noturnas da cidade em uma cansativa volta para casa, eu entendo a tua pequeníssima esperança de que algo inusitado ainda aconteça, de que alguma peça seja movida para um lugar diferente e todas as partes quebradas da vida voltem a ter algum sentido, se é que algum dia realmente tiveram esse sentido.
Também senti a dor de cada amanhecer. Essa mesma dor de estar obrigatoriamente continuando cada uma das atribuições diárias e, no meio disso, entender que nenhuma delas importa, porque o que é importante nunca foi físico, e tu sempre soubeste disso, já que repetidamente reforçaste esse fato ao tentar estar próximo não de lugares e itens suntuosos, mas dos incontáveis tons de verde das plantas, do azul do céu e da vida dos animais. Eu senti o vazio que tu sentes em não conseguir convencer ninguém daquilo que realmente é belo e também deixei rolar pelo meu rosto as mesmas lágrimas quentes e inconvenientes que acabaram por denunciar mais de uma vez a minha e a tua débil gana pela não existência.
Apenas continue. Corra mais riscos se te for confortável. Fique vivo e mantenha o teu coração bom e honesto com todos, mesmo que não exista nenhuma reciprocidade nisso no momento atual. Não tenhas medo de ser quem és até nos dias mais solitários, pois a certeza de que existe amor no mundo é o próprio amor que tu carregas, assim como o amor que observas diariamente. Sim, ele é real, eu garanto que é real, porque agora eu vivo o inacreditável.
O amor dissipará todo o mal. Por amor viveria novamente cada instante de tudo o que me trouxe até aqui, passaria novamente por todas as tempestades e caminhos lamacentos, me afogaria em todas as imensas enxurradas e me colocaria novamente em pé, já fraca, para ser esmagada pelo caos. No final de tudo, depois das trevas, haverá uma grande luz.
Eu e ele estamos em um campo infinito de margaridas, em que a quantidade de cada pétala igualmente infinita não é capaz de representar nem um terço do amor que sinto. Todas as peças realmente se encaixam no final desse quebra-cabeça dificílimo e, por fim, há a certeza de que nada nunca foi tão real e precioso em todo o universo.
Eu sei que é ele. Ele sabe que sou eu.
Ouso dizer que Platão estava certo em afirmar que as almas gêmeas, quando se encontram realmente, acabam por aumentar suas forças por estarem juntas, podendo até mesmo escalar o céu.
Olhos melancólicos, continuem a procurar a luz e, quando a encontrarem, lembrem-se do passado tanto para serem gratos quanto para aprenderem com ele.